julho 30, 2024

Capítulo 46 - Mais uma conversa

Diante das enormes portas de jacarandá entalhadas com figuras de leões, respirei fundo, porque eu já imaginava o que o rei iria me dizer, pensava em todas as broncas que meu pai já havia me dado. Lembrando-me da noite anterior pude perceber que Phillip me seguiu pela floresta e estava atrás de mim quando cheguei à cripta na noite anterior. Ele estava no castelo o tempo todo e eu fui até a cabana de forma imprudente. Como pude ser tão burra e acreditar que ele sairia de perto de mim antes do nosso casamento? Como pude achar que ele iria querer um tempo ou alguma distância, qualquer que fosse essa distância? Ele era quem mais queria essa cerimônia, o casamento e sua coroação. Tomei coragem e empurrei as portas com força. Para minha surpresa, o Conde estava sentado de frente para o rei.
- Vossa Majestade me chamou? - falei curvando-me, quando ambos viraram para olhar diretamente para mim
- Sim, Vossa alteza pode sentar. - papai falou apontando para a cadeira ao lado de Lucas. - Conde, continuaremos nossa conversa mais tarde na festa. - o rei falou a Lucas, apontando para a porta, ele se levantou e seguiu para sair do escritório
- Onde você foi ontem à noite? Por que um dos meus guardas me trouxe o informe de que ontem à noite você desmaiou próximo aos portões do palácio, vinda da floresta? Se não fosse seu pretendente, o futuro rei, talvez se outro a tivesse visto naquele estado... você ainda está fraca e se machucou - ele apontou para o curativo em minha mão - mas é teimosa, não me obedece! Pensei que quisesse se casar hoje! - ele terminou batendo com o punho na enorme mesa de madeira sólida entre nós e se colocando de pé.
- Desculpe-me, papai. - falei pensando na desculpa que daria. - Depois de tudo que ocorreu, da doença de Phillip, vocês presos nos Cárpatos e todos os vampiros no processo, pensei em colocar ramos de lavanda em meu buquê, para trazer sorte ao casamento. Mas não havia lavanda florescendo em nosso jardim, e lembro de visto algumas próximas ao castelo, nas proximidades da floresta. Acabei me machucando, também não imaginava que ainda estava tão fraca... - falei rapidamente e quase sem respirar, imaginando o que se passava na mente do rei e como ele iria ou não acreditar na minha mentira, tentei ser o mais convincente
- Você quer que eu cancele o casamento? - o rei falou com uma voz áspera e foi interrompido por uma batida na porta
- Vossa Majestade me chamou? - Phillip entrou imponente e, sem olhar para mim, sentou-se ao meu lado, quando o rei o mandou sentar-se com um gesto
- Príncipe Phillip, a decisão é sua, pois faltam poucas horas para a cerimônia e não sei se acredito que alguns ramos de lavanda seriam o motivo desta fuga noturna de minha filha, mas em poucas horas essa teimosa será sua responsabilidade, por isso quero a sua decisão a respeito do assunto. - o rei falou apontando em minha direção
- Lavanda? Foi por isso que te encontrei ontem desacordada e sendo acudida por um dos guardas do castelo? - ele finamente olhou em meus olhos e engoli em seco, nervosa e tremendo
- S... Sim, lavanda... ajuda em começos. - falei baixinho - eu li em um livro antigo...
- Vossa Majestade, acredito que é uma boa causa. A princesa devia estar ansiosa por hoje, toda essa festa depois de tantas desventuras. Vamos prosseguir. Vou para meus aposentos me arrumar, temos pouco tempo. - rapidamente meu noivo se levantou e saiu sem olhar para trás.
- Você ouviu seu noivo. Levante-se e vá se arrumar. Pedirei a sua aia para colocar os ramos de lavanda em seu buque. Agora vá! - o rei ordenou apontando para a porta.
Levantei e caminhei apressadamente para a porta. Subi as escadas com a mesma velocidade. Chegando ao meu quarto e fechando a porta. Entrei em meu banheiro e deitei na banheira para um longo banho aromático. Ao final do banho rapidamente chamei minha aia para me auxiliar, pois eu precisava me arrumar e o vestido era grandioso. Ainda faria o cabelo e uma leve maquiagem.

julho 18, 2024

Capítulo 45 - Uma noite antes

Finalmente desci as escadas em direção ao salão de jantar. O rei me encontrou no meio do caminho e pegou-me pelo braço, para que eu o acompanhasse até o salão. Papai agia de forma estranha nesta noite e eu não compreendi a princípio o porquê. Chegando ao salão percebi que os convidados estavam sentados em outra ordem. O príncipe estava no extremos oposto da mesa, em relação ao meu pai, mas Lucas estava à sua direita.
Era estranho sentar tão distante do príncipe, mas havia algo. O rei iria fazer um pronunciamento. Ele me falou de suas intenções enquanto caminhávamos pelos corredores do palácio até chegarmos ao salão.
Phillip olhava com certo desdém para Lucas, que apesar de estar na minha frente, eu sempre sentava à esquerda do rei, não recebia minha atenção. Pouco antes de começarmos a refeição, o rei levantou-se e começou:
- Amanhã, minha filha e única herdeira de meu trono se casará. Passarei a ter um filho, príncipe Phillip, que também amanhã será coroado Rei de seu reino. O casamento era o detalhe que faltava para que ele tivesse direito a seu título. Teremos as duas cerimônias juntas. Hoje, os cavalheiros estão convidados pelo rei para uma comemoração à parte, a teremos após a refeição, . - terminando de falar, o rei sentou-se e começou a comer.
Fiquei tensa. Comemoração somente entre os cavalheiros? Quase não consegui comer, embora o rei não parecesse perceber minha tensão, ele reparou no prato quase intocado.
- Vossa Alteza está passando mal? - falou o rei olhando diretamente para meu prato.
- Não, Vossa Majestade. Perdoe-me, estava perdida em meus pensamentos. - respondi voltando a comer.
- Ah bom! - falou o rei, olhando nos meus olhos - Não vou aceitar mais nenhum adiamento, tampouco aceitarei minha filha desmaiando em meio às festividades de amanhã. Assim que você esvaziar o prato, sua aia lhe levará ao seu quarto para descansar.
- Mas, papai, que comemoração é essa que você paneja para hoje? - perguntei soltando os talheres e o som deles caindo sobre o prato ressoou em todo salão, trazendo um silêncio repentino e fazendo os olhares se voltarem para mim.
O rei fez um leve movimento com a mão para que todos voltassem a comer. Olhou diretamente nos meus olhos e respondeu:
- Nunca mais faça isso! Planejei uma noite de jogos e bebidas para os convidados da festa. Sim, só para os homens! Não deveria compartilhar isso com minha filha donzela, mas temo que você não termine seu prato se eu não lhe explicar o que pretendo. Aliás, amanhã à noite você partirá depois da festa com o rei Phillip para o reino dele.
- Mas eu não arrumei nada, como farei isso. Nem me despedi... - antes que eu terminasse minha fala, Lucas me interrompeu
- Você sabe que precisa terminar de comer e que o rei está preocupado com sua partida amanhã, pois da última vez em que estiveram lá você não aguentou a viagem? - ele perguntou apontando para meu prato, ainda cheio.
- Tem razão. - respondi voltando a comer. Parei os questionamentos e também parei de olhar em volta, olhando somente para meu prato e esvaziando-o.
Assim que terminei, Anna se posicionou atrás de mim. Pedi licença ao rei e aos demais nobres e percebi que Phillip já havia saído da mesa. Onde ele estaria? Respirei fundo, precisava dormir, mas onde estaria meu noivo? Minha cabeça não parava de questionar.
Pedi a Anna que me deixasse sozinha ao chegar no quarto. Ouvi os passos de minha aia sumirem no corredor e saí silenciosamente do quarto. Cheguei até o último degrau da escada sem ser ouvida. Observei de fora do salão e todas as senhoras já haviam se recolhido, mas o príncipe não estava lá. Saí para o jardim. A noite estava bonita, mas eu procurava Phillip.
Passei pelos portões. Será que ele foi até a cabana? Pensei caminhando apressadamente através da floresta. Senti minha fraqueza voltar quando cheguei à cabana. Sentei-me na cama antes de descer para a cripta. Desci as escadas e percebi que a cripta estava iluminada pelas tochas e pelas velas como sempre e de um canto que eu não havia notado surgiu uma silhueta familiar.
- Vossa alteza não deveria estar aqui. - ouvi a voz de Lucas falar.
- O que você está fazendo aqui? - falei sem conseguir afastar a tensão em minha voz - Nenhum mortal é capaz de ver essa cabana. E a cripta é escondida!
- Mas você vê, não é. - ele respondeu com um tom irônico.
- Sim, Phillip a construiu assim para que eu o visse, eu o encontrasse. - falei segurando a raiva
- Ou seja, esse tempo todo ele te manipulou para que você o amasse. - vi um punhal brilhar em sua mão
- O que você quer aqui, Conde? - ouvi a voz de Phillip atrás de mim nos degraus.
- Queria explicar para a princesa como criaturas como você agem. Trabalhando toda a sua teia de caçadores para seduzir a presa! - vi ira nos olhos de Lucas, que começou a caminhar em minha direção.
- Se você machucá-lo, você só me afastará mais ainda de você, Lucas! - falei ameaçando-o, mas ele se aproximou até agarrar meu braço
- Vou continuar te explicando, minha princesa, como essas criaturas tem todas as suas ações calculadas, são seres frios, não se apaixonam e não amam. - ele me puxou para perto de seu corpo, segurando meu pulso e fazendo um leve corte em minha mão.
Pude ver os olhos de Phillip mudarem de cor para o vermelho ao ver o corte. Doeu muito. Não sei se por conta da fraqueza ou da dor, chutei o Conde. Ele caiu no chão e corri escada acima e para fora da cabana. Toda a tensão a que Lucas me submeteu só piorou meu estado. Estava fraca, mas precisava voltar para o castelo.
Corri pela floresta em direção ao castelo, finalmente avistando os guardas e o portão. Cheguei bem perto dos portões e pedi socorro. No momento em que um dos guardas chegou até mim, desmaiei. Tudo escureceu tão rápido e ficou tão silencioso. Será que Phillip saiu de lá. Será que ele estava bem. Sonhei com o casamento.
Na manhã seguinte acordei com Anna trazendo o meu café em uma bandeja:
- Vossa Alteza não deveria se aventurar na floresta na véspera do casamento. - ela disse deixando a bandeja na mesa perto da janela. - O Rei falou que a aguarda após o café em seu escritório.
As palavras de Anna pareciam facas, mais uma bronca ou quem sabe notícias ruins logo após os café. Olhei para o lugar onde Lucas cortou minha mão e havia uma bandagem. Não me lembrava de como cheguei no meu quarto e muito menos quem trocou minhas roupas. Mas logo que Anna saiu pela porta, Phillip saiu de trás da cortina do quarto e sentou-se na ponta da cama.
- Fui eu. Cheguei até você nos braços de um dos guardas e peguei-a nos meus braços e a trouxe para seu quarto. Depois tirei seus sapatos e parte do seu vestido, mas não fiz nada impróprio, fique tranquila. Coloquei um curativo em sua mão, acho que ficará uma cicatriz... - ele falou segurando minha mão
- O que você faz aqui? Você é louco? Se o rei lhe encontrar aqui... - falei sussurrando.
- Estamos a algumas horas de nosso casamento e minha coroação. Seu pai irá perguntar o que você fazia fora dos portões e me preocupa dele questionar se você teria consições de se casar hoje, pois acho que essa era a vontade de Lucas, adiar mais uma vez.
- Eu não quero! - falei me levantando irritada rapidamente e quase caindo
- O rei não vai querer saber da sua opinião e me chamará. Preciso que você não conte a ele o que de fato ocorreu. Preciso que você invente uma desculpa boba. Quando eu for chamado, quero que você fique em silêncio e me permita responder ao rei. Isso pode adiar nosso casamento, então preciso que você faça o que digo, certo? - ele falou se levantando e caminhando para a porta, antes de sair ele virou-se e falou - Eu te amo!
Fiquei sozinha com meus pensamentos e aquelas três palavras vagando em minha mente. Anna entrou quando eu já estava terminando meu dejejum. Após me ajudar a me vestir, seguimos para o escritório do rei.