Antes que eu respondesse ouvimos uma batida na porta. Era Anna. Eu precisava experimentar uma última vez o vestido para amanhã e ela veio me buscar para que eu fizesse isso. Levantei-me apressadamente. Pedi licença ao príncipe e segui minha aia até a sala onde duas costureiras e outras servas já estavam.
Vesti o vestido que aparentava levemente mais largo, mas nada que pequenos ajustes de última hora não resolvessem. Colocar o vestido pela última vez, antes da cerimônia, me fez chorar. Depois de amanhã eu me despediria de meu reino. De minha infância e de toda uma vida que havia até ali. Lucas entrou na sala dizendo querer falar comigo, mas rapidamente se calou e ficou com o olhar admirado em minha direção.
- O que houve, Lucas? O que é mais urgente do que meus preparativos? - questionei impaciente.
- Posso aguardar. Vossa Alteza irá se trocar e talvez possa dar uma volta com seu amigo de infância pelo jardim? - ele falou soando mais como uma ordem do que como uma sugestão.
- Sim, mas saia agora para que eu possa me trocar. - apontei para a porta com raiva, estava cansada de suas interjeições e ele agora parecia notar
Ele saiu. Minha aia me auxiliou para que eu vestisse meu vestido azul de antes. Saí da sala fechando a porta atrás de mim. Segui para o Jardim, já era quase a hora do almoço, mas pedi ao rei que me permitisse um pequeno atraso para que eu conversasse com Lucas. No jardim, Lucas me aguardava no banco onde eu costumava sentar a espera do retorno deles.
- Fale-me, meu amigo. - comecei a conversa de forma amistosa.
- Diga-me que Vossa Alteza não prosseguirá com essa loucura! - disse ele avançando em minha direção, pegando minhas mãos.
- Do que você está falando, Conde? - eu já estava impaciente e irritada com a insistência dele.
- Você deseja mesmo casar-se com uma criatura das trevas, que não poderá lhe dar futuro, ou herdeiros! O rei sabe do que você e ele estarão abdicando? - ele falou em tom de súplica
- Lucas, eu amo Phillip. Sei de seus sentimentos por mim, mas quero que você respeite os meus sentimentos por meu noivo. Nada me fará mudar de idéia! - respondi irritada levantando
- Mas como será a sua vida? Como conseguirá viver numa noite eterna? E os herdeiros? - ele insistiu
- Já conversei com Phillip. Ele pode me dar filhos, mas não é algo que eu queira agora. Sobre a noite, no reino dele há um feitiço, já vimos um pôr do sol juntos. - respondi assertivamente.
- Então não posso ter mais esperança? - ele questionou desolado, abaixando a cabeça e olhando para o chão.
- Tenho você como um irmão, Lucas. Mas é só isso. Meu coração é dele. - falei olhando ao redor. Percebi que já havia passado muito tempo e provavelmente perdemos o almoço. O rei ficaria furioso.
- Tenho que voltar, preciso me alimentar. Ordens do rei. - falei quase num sussurro, correndo de volta para dentro do castelo.
Voltamos para dentro do palácio e o salão de jantar já estava vazio, todos já haviam almoçado. Pedi a Anna para levar algo para que eu almoçasse em meu quarto. Chegando lá percebi uma sombra perto da janela. Era meu pretendente. Meu príncipe. Mas sua expressão era irritada.
- Por que você não estava no almoço hoje? Seu pai falou que você se atrasaria, mas você não foi e vi quando saiu do palácio acompanhada de seu amigo Lucas. O que é mais importante do que sua saúde? - notei claramente a irritação em sua voz
- Lucas me chamou para conversar. - falei segurando a respiração – parecia importante.
Phillip que estava com os punhos cerrados acertou um soco na parede ao lado da janela, quebrando algumas pedras dela. Isso me assustou.
- O que ele queria? O que ele ainda quer? - Phillip falou entre os dentes, com a voz num tom ríspido que eu nunca ouvira antes, seus olhos mudando de cor para um vermelho sangue.
Caminhei rapidamente até ele e o abracei, aninhando minha cabeça em seu peito, como seu cheiro era agradável e apesar da pele gelada, era confortável para mim abraçá-lo.
- Ele achava que ainda conseguiria me convencer de desistir do casamento. - falei sem respirar, pois estava muito tensa.
Uma batida na porta nos interrompeu. Era Anna trazendo uma bandeja com o almoço. O cheiro me fez salivar, eu estava com fome. Peguei a bandeja e pedi a ela que não deixasse ninguém me interromper, pois queria comer tranquilamente. Coloquei a bandeja na mesa próxima à janela e sentei-me na poltrona de frente para a mesa. Pedi a Phillip que se sentasse também.
- Preciso comer. Meu vestido precisou de muitos ajustes. Não quero novos ajustes, nem novos adiamentos. Amanhã nos casaremos. - falei com um sorriso no rosto
- Como? Mas você falou que estava conversando com Lucas sobre desistir… - Phillip falou sem entender e se reclinando em minha direção, neste momento eu o interrompi
- Ele queria que eu desistisse, mas pedi a ele que respeitasse minha decisão e que meu coração era seu! - olhei para ele enquanto falava, pegando com um garfo uma porção de comida levando-a até a boca. Eu estava de fato com fome. Mas os olhos de Phillip congelaram nos meus e ele parecia mais faminto do que eu, seus olhos voltaram à cor negra que eu amava.
- Vossa Alteza falou isso a ele? - o príncipe falou confuso, sem desviar os olhos dos meus.
- Com essas palavras, meu amor. - complementei colocando outra garfada na boca. - Acredito que ele não insistirá mais. Há mais algum preparativo do qual nos esquecemos para amanhã? - perguntei mudando completamente o foco da conversa, propositalmente, sem que os olhos de Phillip desviassem de mim.
- Como a princesa me chamou? - ele falou soando ainda mais confuso.
- Estamos sozinhos. Você sabe de meus sentimentos por você. Não chamarei meu príncipe por seu título mais. Por agora, lhe chamarei de meu amor. - falei colocando mais um pouco de comida na boca, com um leve sorriso malicioso no canto do lábio.
Phillip se levantou de sua poltrona e se ajoelhou em minha frente numa velocidade, cujo susto me fez engasgar. Antes que eu pudesse prosseguir na minha refeição ele beijou meus lábios delicadamente e falou quase num murmúrio:
- Repita, por favor, minha princesa. Por favor… - Antes que ele falasse mais uma vez repeti:
- Não lhe chamarei mais de Vossa Alteza quando estivermos sozinhos. Meu príncipe, sozinhos você sempre será meu amor.
Ele me puxou para ele e encheu meus lábios de beijos. Ficamos de pé. Ele parecia estar em uma espécie de transe. Intercalamos beijos com abraços apertados de cortar a respiração, eu podia sentir cada curva de seu corpo e seus músculos sob a roupa. Então ele se afastou e disse:
- Vejo minha amada no jantar. Por favor, não se atrase. Será nossa última refeição como solteiros. - ele se virou e saiu do quarto.
Sentei novamente, terminei minha refeição e deitei para descansar. Na hora do jantar fui acordada por Anna que rapidamente me auxiliou para que eu estivesse arrumada e bela para descer em tempo.